A surpresa positiva do último dado de inflação no Brasil não parece ter convencido o presidente da autoridade monetária, Roberto Campos Neto, a estimar possíveis cortes na taxa básica de juros no curto/médio prazo.
Em evento realizado nesta quinta-feira, o presidente do Banco Central do Brasil avisou que embora a inflação tenha recuado, as pressões permanecem em um cenário de demanda relativamente forte.
Campos Neto relembrou também que as expectativas de inflação por parte do mercado estavam ancoradas em 2022, porém desde novembro deste mesmo ano houve um processo de deterioração confirmado pelo boletim Focus, inclusive para horizontes mais longos.
A mediana das estimativas coletadas pelo Banco Central no mercado para o IPCA em 2024 inclusive subiram de 4,02% há cerca de um mês para 4,14% no último Focus. Para 2024, também houve elevação de 3,80% para 4%.
A mensagem do presidente da autoridade monetária foi claramente hawkish, sinalizando ao mercado a necessidade de manter a calma e focar na ancoragem da meta de inflação no médio/longo prazo e não em dados isolados de curto prazo.
Como as expectativas ainda estão distantes da meta a ser perseguida pelo Banco Central, o recado de Campos Neto pode ser uma água no chopp do mercado, que estava até então muito otimista com um cenário mais flexível a curto/médio prazo. Entre outras palavras, ao contrário do que o mercado espera, ainda não há expectativa por parte do Banco Central para cortar a taxa Selic.
A antecipação de cortes na taxa Selic aparenta razoável exagero no mercado. A taxa do contrato de juros futuros com vencimento em 2028 despencou de cerca de 13,50% no início de março para 11,94% nesta última quarta-feira.
Parte deste movimento de queda pode ser explicada pela força das operações de carry trade em curso nas principais praças financeiras. A acomodação do dólar frente a várias outras moedas abriu janelas para entrada de capital estrangeiro em várias economias, buscando se beneficiar com o diferencial de juros muito favorável neste momento.
O secretário do Tesouro, Rogério Ceron, disse nesta última terça-feira que os investidores estrangeiros estão voltando com força ao mercado de dívida pública brasileiro. Na semana passada, por exemplo, a demanda pelos leilões de títulos do Tesouro superou em quatro vezes a oferta, volume considerado significativo.
Observando o forte apetite dos investidores, Ceron adiantou que o governo brasileiro espera dobrar a participação estrangeira na dívida pública interna até 2026. Caso seja confirmada as expectativas do governo, o percentual de estrangeiros sobre a dívida pública chegará a impressionantes 20%. Nível considerado elevado e otimista para os padrões históricos brasileiros.
A confiança nas novas regras fiscais a serem confirmadas pela aprovação do novo arcabouço no Congresso, juntamente com a redução da inflação, pode colocar o Brasil em destaque, contrastando com cenários bem mais desafiadores em importantes economias globais.
Nesta quarta-feira, o FMI alertou vários países para uma maior disciplina fiscal. A instituição estima que China, por exemplo, vai alcançar uma dívida de 100% PIB até 2028, o que representa praticamente o dobro do nível dívida/PIB no pré-pandemia.
Para os Estados Unidos, o FMI espera que a dívida vai alcançar 135% PIB em cinco anos, nível nunca antes registrado na história do país. A aceleração do endividamento em ambas as potências é considerada bastante acelerada para os padrões históricos, alcançando níveis tecnicamente insustentáveis em termos de sustentabilidade macroeconômica.