Uma semana após membros do Fomc decidirem elevar o intervalo da FFR para 4,75% a 5% ao ano, respaldado na sequência tanto pela entrevista à imprensa do chair Jerome Powell, quanto também pelos importantes gráficos de projeções da autoridade monetária dos principais indicadores econômicos, os investidores parecem começar entender apenas agora qual era a mensagem que o FED está transmitindo aos mercados.
Analistas em Wall Street parecem um pouco perdidos entre olhar para os desafios de contenção da crise bancária ou para a persistência da inflação elevada, ainda muito acima da meta de 2% a ser perseguida.
Combate a dois problemas diferentes
A dificuldade de entendimento da atuação do FED é justificada pelas ferramentas completamente distintas para combater os dois problemas. Na parte do risco sistêmico, está claro que o Banco Central dos Estados Unidos consegue apoiar as instituições financeiras que precisam de liquidez. A linha de crédito emergencial BTFP foi um movimento relevante e certeiro do FED, que por sinal está sendo utilizado pelos bancos.
A autoridade monetária também acertou ao atuar de forma conjunta com a secretaria do Tesouro e o FDIC em frentes mais amplas, facilitando, por exemplo, a formação de pontes para negociação de aportes de outros bancos nas instituições financeiras com necessidade, transações de compra e venda de ativos ou mesmo capitalização da instituição com recursos do governo.
Ambiguidade na postura do FED
Quando estourou a crise, muitos em Wall Street estavam concentrados apenas na decisão a ser tomada sobre a FFR, como se a queda ou interrupção das elevações na taxa básica de juros fosse o suficiente para salvar as instituições e impedir um contágio maior de uma crise bancária. Entretanto, esta não é a solução para o cenário atual.
O FED transmitiu aos mercados a possibilidade de combater a inflação persistentemente elevada (hawkish na FFR/política monetária) ao mesmo tempo, em que protege o sistema financeiro (dovish em medidas macroprudenciais). Ou seja, a FFR continuará elevada e talvez subir um pouco mais, fato que não atrapalha, e não impede, as medidas flexíveis tomadas para salvar os bancos em necessidade.
Existe ainda certa dificuldade para o mercado entender como um Banco Central consegue ser hawkish na política monetária e dovish nas macroprudenciais ao mesmo tempo. Apesar de serem estratégias conflitantes quando comparadas, caso a macroprudencial seja feita de forma cirúrgica, chegando exatamente na fonte do problema, é possível trabalhar nas duas frentes ao mesmo tempo.
Futuro incerto
Ainda existe grande discussão em Wall Street sobre os próximos passos da política monetária do Fomc.
Entretanto, a mensagem está muito clara, não somente nos discursos dos membros votantes, como também nas suas projeções. O gráfico de pontos revelado pelo FED (imagem acima) mostra que a grande maioria dos membros acredita que a FFR encerrará 2023 no intervalo de 5% a 5,25% ao ano. Ou seja, haverá, ainda mais um aumento de 0,25 pontos percentuais.
Apenas um único membro do Fomc acredita que a FFR ficará estável até o final deste ano, entre 4,75% até 5% ao ano. Outros três membros do Fomc enxergam necessidade de a taxa básica de juros subir ainda mais, encerrando o ano entre 5,25% a 5,5% ao ano. Mais outros três membros do Fomc são mais agressivos ainda, estimando que a FFR estará entre 5,5% a 5,75% até o final deste ano. Por fim, um membro votante acredita que a FFR precisa estar entre 5,75% até 6% no final de 2023.
Está bastante claro, portanto, que se existe alguma dúvida no Banco Central sobre a FFR neste ano, está mais para subir do que para ficar estável ou cair. A maioria acredita que será necessário apenas mais uma alta de 0,25 pontos percentuais, porém sete membros votantes enxergam necessidade de a FFR subir acima dos 5,25%.
A reação positiva dos mercados nos últimos dias pode ser justificada pela eficácia da atuação do FED até o momento. Caso o combate à inflação fosse descartado ou deixado de lado, as incertezas para o cenário de médio e longo prazo iriam aumentar ainda mais, o que é sempre visto como algo negativo para o capital de risco.
Pé no freio!
Isso não significa que o ambiente estará mais tranquilo, pois inevitavelmente haverá desaceleração do crescimento global. A grande maioria dos banqueiros centrais estão subindo suas respectivas taxas básicas de juros para combater a inflação elevada e disseminada em diversos setores da economia.
O trabalho de contenção da inflação, bem como reversão das expectativas dos índices de preços para as suas metas, não está fácil por conta dos efeitos secundários provocados pela guerra na Ucrânia, receio sobre as cadeias de produção, renovação energética para matrizes mais limpas e reposicionamentos geopolíticos. Todos estes drivers colaboram para ampliação do tempo necessário para que a política monetária mais dura consiga fazer o efeito desejado pelos banqueiros centrais.
Dos Estados Unidos à China, as expectativas de crescimento econômico para este ano estão muito abaixo da média histórica. Quanto maior a demora para combater a inflação, maior será o tempo em que o mundo permanecerá neste cenário de PIB fraco.