O mercado operou de forma bastante eufórica nesta quarta-feira após o Departamento de Trabalho dos Estados Unidos informar que o CPI (Índice de Preços ao Consumidor) subiu apenas 0,1% em março, abaixo dos 0,20% previsto pelos analistas de Wall Street e também inferior aos 0,4% registrados em fevereiro.
À primeira vista, a informação isolada parece ser realmente animadora. Inflação rodando numa base de 0,1% mensal significa eficácia de política monetária, o que justificaria não somente interrupção no movimento de alta da FFR, como até mesmo início de um ciclo de cortes nos próximos trimestres.
Inclusive, começaram a circular boatos de que o FED poderia sinalizar a magnitude dos cortes nas suas próximas reuniões do Comitê. Ao contrário do que se propagou hoje pelos mercados, não existe qualquer possibilidade de flexibilização na política monetária norte-americana no curto/médio prazo, ao contrário do cenário diferenciado que está no horizonte da política monetária brasileira.
Primeiramente, março é considerado um mês de inflação historicamente baixa nos Estados Unidos. Mas mesmo essa pequena alta de 0,1%, o acumulado dos últimos 12 meses no CPI está em 5%, ainda em região de nível bastante crítico para os padrões americanos, muito acima da meta de 2% a ser perseguida pelo FED.
Em segundo lugar, a inflação norte-americana sofreu considerável ajuda da recente queda dos preços de energia. Somente no mês de março, o recuo neste segmento foi de 3,5%. No acumulado de 2023, a queda do setor de energia já alcança 6,4%.
É improvável que os preços de energia continuem caindo nos próximos meses, principalmente porque a Opep+ anunciou corte significativo na produção de petróleo, com início para o mês de maio, se prolongando até dezembro de 2023, totalizando 3,657 milhões de bpd. O risco de deslocamento de preços no setor de energia é mais altista do que baixista a partir do 2 trimestre de 2023.
Terceira observação relevante está na dinâmica de inflação subjacente. Quando se observa o núcleo do CPI, que exclui segmentos voláteis como alimentos e energia, houve alta de 0,4% no mês de março, praticamente em linha com a elevação de 0,5% observada em fevereiro. Este dado revela que os demais preços de produtos e serviços na economia norte-americana permanecem subindo de forma acelerada. No acumulado dos últimos 12 meses, o núcleo do CPI está em 5,6%, rodando a cerca de 300% acima da meta de inflação.
Em quarto lugar, apesar de o CPI ser considerado a inflação oficial nos Estados Unidos, a autoridade monetária utiliza outro índice de inflação para tomar suas decisões, conhecido como PCE. Este índice é inclusive utilizado nas projeções de inflação do FED, divulgadas a cada trimestre, ao invés do CPI.
O próximo PCE será divulgado momentos antes da reunião de Comitê, no final de abril. Portanto, a antecipação de cortes da FFR não somente é precipitada, como infundamentada pela base de dados costumeiramente utilizada pelo FED.
Não por acaso, as bolsas americanas reverteram o movimento durante o dia, fechando o pregão em baixa. A euforia criada pelo CPI não se sustentou por muito tempo. No melhor cenário é precisa aguardar uma surpresa muito positiva no PCE para provocar uma revisão nas projeções da autoridade monetária norte-americana para o fechamento da inflação neste ano.
Por enquanto, mesmo com o nível atual de FFR, somado a um possível novo aumento de 0,25 ponto percentual na próxima reunião, o Banco Central dos Estados Unidos espera que o PCE vai encerrar 2023 aos 3,3%, com o seu núcleo aos 3,6%.
Enquanto o núcleo PCE não demonstrar ancoragem em torno da meta de 2%, não haverá justificativa técnica para flexibilização da política monetária.