Os países que constituem a Opep+ (Organização dos Países Exportadores de Petróleo e aliados), surpreenderam o mercado neste último domingo anunciando um corte surpresa relevante na produção de petróleo, sob a justificativa de apoiar a estabilidade de preços.
Ao todo, serão cortados 1,66 milhão de barris por dia (bpd), começando a partir do mês de maio até o final de 2023. Após o anúncio feito no último domingo, a Opep detalhou como serão distribuídos os cortes.
Sozinha, a Arábia Saudita vai cortar 500 mil bpd. Logo na sequência, o Iraque vai reduzir 211 mil bpd, Emirados Árabes Unidos 144 mil bpd, Kuwait 128 mil bdp, Casaquistão 78 mil bpd, Argélia 48 mil bpd, Omã 40 mil bpd e Gabão 8 mil bpd. Além disso, a Rússia, que integra a Opep+, confirmou que vai estender seu atual corte de 500 mil bpd até o final de 2023, garantindo, portanto, a meta de cortes totais em 1,66 milhão de bpd.
Soma-se, ainda, aos cortes adicionais de produção de petróleo anunciados anteriormente, em outubro de 2022, na quantidade de 2 milhões de bpd. Essas duas reduções totais de produção alcançarão 3,657 milhões de bpd.
A decisão pegou o mercado de surpresa, pois o barril do Brent estava sendo negociado desde meados do ano passado na região dos 75,00 / 80,00 dólares. Distante da máxima registrada aos 139,00 dólares no auge da crise provocada pela invasão da Ucrânia, porém em linha com a mediana de preços observada nos últimos anos.
Caso o barril estivesse abaixo de 50,00 dólares, dentro de um ciclo de baixa, podia-se esperar alguma reação da Opep+. Como os preços da commodity não estão baixos para os padrões históricos, a decisão surpreendente anunciada neste domingo pode ter sido motivada por outras razões.
Poucos dias atrás, em 23/03, a secretária de Energia dos Estados Unidos, Jennifer Granholm, disse que pode levar anos para o seu país reabastecer a famosa reserva estratégia de petróleo, que por sinal foi bastante consumida durante o início da invasão russa na Ucrânia para estabilizar os preços da commodity. Biden também havia informado que iria abastecer a reserva somente quando o preço do barril cair abaixo de 70 dólares.
Este corte surpresa da Opep+ pode ter motivações geopolíticas, com os países produtores se distanciando do ocidente. Os laços da Arábia Saudita se desgastaram com os Estados Unidos na administração Biden. As recentes declarações de Granholm podem ter sido a gota d’água que enfureceu os árabes, até então na expectativa de retorno dos Estados Unidos às compras de petróleo para reabastecer sua reserva estratégica. Do lado russo, está claro o apoio na decisão da Opep, como forma de retaliar as sanções recebidas pelos países ocidentais.
A recente crise bancária nos Estados Unidos acabou demonstrando fragilidade no sistema financeiro, criando uma janela mais confortável para retaliação mais forte dos países da Opep+.
Anteriormente, quando havia cortes de produção, os Estados Unidos contra-atacavam aumentando sua produção de xisto. No cenário atual, os produtores de xisto não conseguem aumentar a produção por dois motivos principais: (i) custo mais elevado de extração e (ii) dificuldade de acessar crédito neste cenário de juros elevados, inflação alta e bancos na defensiva.
Antes mesmo dos cortes anunciados no último domingo, traders da commodity projetavam déficit de oferta de 1,4 milhão de bpd entre o mês de maio e agosto. Com os cortes adicionais de 1,66 milhão de bpd, haverá uma pressão de alta no preço do barril ainda maior.
Desta forma, a Opep+ fica mais confiante em cortar produção, já que seu principal concorrente não possui condições de reagir e/ou tomar market share. A medida também pode ser entendida como um recado ao governo Biden, para voltar a se aproximar dos países produtores ou assumir consequências macroeconômicas mais graves.
Entre as sequelas a serem provocadas na economia, a primeira da fila está justamente na inflação. O presidente do FED de St. Louis, James Bullard, disse nesta última segunda-feira que o aumento nos preços do petróleo pode tornar o combate à inflação um pouco mais difícil. O barril na cotação atual já pressiona a inflação. Com o preço mais elevado, pode criar pressão sobre os preços ainda maiores.
A avaliação é endossada pela AIE (Agência Internacional de Energia), que emitiu um comunicado também nesta segunda-feira ressaltando que os cortes anunciados pela Opep+ devem aumentar as projeções de déficit de oferta de petróleo nos próximos meses, pressionando a inflação no mundo inteiro.